O Acompanhamento Terapêutico do paciente com depressão

Autores: 

  • Luiza Nestrovski Camargo – Acadêmica de Psicologia (PUCRS), autora responsável. Formação no “Curso de Capacitação em Acompanhamento Terapêutico” da CTDW. E-mail: [email protected]
  • Eurico Camargo Neto – Doutor em Bioquímica (UFRGS), Laboratório Nobel. E-mail: [email protected]

RESUMO:

Neste trabalho abordamos o Acompanhamento Terapêutico do paciente com depressão. A depressão é uma alteração psíquica e orgânica caracterizada por transtorno do humor, ou transtorno afetivo, que leva o indivíduo a diferentes percepções da realidade e da valorização da vida. Esta doença pode se prolongar por espaço de tempo indeterminado, de semanas a anos. O tratamento do paciente depressivo pode ajudá-lo a voltar a ter equilíbrio emocional e uma satisfatória vida de relação. O Acompanhamento Terapêutico é uma modalidade de tratamento na qual o psicólogo acompanha o paciente no seu dia-a-dia, auxiliando-o a desenvolver suas tarefas e a resolver suas dificuldades. Neste trabalho apresentamos aspectos da depressão e da atividade do Acompanhante Terapêutico.

 

Palavras-chave: Acompanhamento Terapêutico; Depressão; Família.

Introdução

– Depressão

            O paciente depressivo apresenta oscilações de humor que afetam, particularmente, a sua auto-estima. Diante disso, sua capacidade de relação fica diminuída, observando-se uma inibição do seu comportamento, ficando dependente das pessoas que possam ajudá-lo a decodificar os processos e desafios de sua rotina diária (MAUER SK e RESNEZKY S, 1987).

A causa exata da depressão ainda não está devidamente estabelecida. Alguns pesquisadores aceitam a hipótese de que um desequilíbrio bioquímico dos neurônios seja responsável pelo controle do humor, baseados na comprovada eficácia dos antidepressivos, o que não exclui tratamentos não farmacológicos. O uso continuado da palavra pode levar a pessoa a obter uma compensação bioquímica (STORESUM JG, 2001).

Os transtornos do humor constituem um grupo de condições clínicas que comprometem a vida social, profissional e interpessoal do indivíduo (APA, 1994; KAPLAN e SADOCK, 1993) e são caracterizadas por:

– perda do senso de controle,

– experiência subjetiva de grande sofrimento,

– perda de energia e interesse;

– humor deprimido;

– diminuição do desejo em realizar tarefas que antes prazerosa (anedonia);

– problemas relacionados ao sono;

– perda de energia ou fadiga constante;

– dificuldade de concentração e diminuição na habilidade de pensar,

– dificuldades em tomar decisões;

– perda de apetite;

– baixa auto-estima;

– sentimentos de inutilidade ou culpa,

– pensamentos sobre morte e suicídio.

Estima-se que 17% das pessoas adultas sofrem de uma doença depressiva em algum período da vida. Não podem melhorar por conta própria ou através dos pensamentos positivos, conhecendo pessoas novas, viajando, passeando ou tirando férias. Sem tratamento, os sintomas podem durar semanas, meses ou anos. O tratamento adequado, entretanto, pode ajudar a maioria das pessoas que sofrem de depressão (BALLONE GJ, 2011).

 


– Por que o AT?

A idéia do “Acompanhante Terapêutico” (AT) surgiu na Argentina na segunda metade do século XX como uma alternativa de tratamento aos pacientes que não respondiam à terapêutica clássica. O AT integrava uma equipe de abordagem multidisciplinar e participava ativamente da vida familiar, dos grupos de amigos e com colegas de escola (MAUER & RESNEZKY, 1987).

O AT deve ter autocontrole e estar em sintonia com seus próprios sentimentos, bem como ter disponibilidade para se envolver em situações clínicas exigentes, que coloca o profissional em situações de grande intensidade afetiva e de difícil manejo. É Imprescindível que o AT se submeta à análise e supervisão para que possa elaborar e se preparar para o que experimenta no trabalho. Além disso, é fundamental que possua uma base profissional que possibilite a construção de uma clínica consistente (METZGER, 2006; CAMARGO, 1991).

De acordo com Mauer e Resnezky, (1987), o AT deve ser capaz de dissociar-se para poder, por um lado, relacionar-se com o paciente e, por outro, manter um distanciamento critico que lhe permita observar e avaliar a interação. O AT não é um amigo, ainda que possa estabelecer laços afetivos muito fortes com o paciente. Ele faz parte de uma equipe psicoterapêutica, realiza uma tarefa assistencial e é remunerado pelo seu trabalho.

Em 1987, os mesmos autores sugeriram as principais funções do acompanhante terapêutico:

1) conter o paciente;

2) oferecer-se como modelo de identificação;

3) trabalhar em um nível dramático vivencial e não interpretativo;

4) emprestar o “ego”;

5) perceber, reforçar e desenvolver a capacidade criativa do paciente;

6) informar sobre o mundo objetivo do paciente;

7) representar o terapeuta;

8) atuar como agente ressocializador;

9) servir como catalisador das relações familiares.

Esses autores ressaltam ainda as condições que um indivíduo deve ter para ser um acompanhante terapêutico, onde destacam-se:

– vocação para a assistência,

– alto grau de comprometimento,

– interesse por trabalhar em equipe,

– maturidade,

– autonomia,

– capacidade de empatia e vínculo,

– flexibilidade em estabelecer limites fortes,

– capacidade de aliar a teoria com a prática,

– ausência de preconceitos e estereótipos.

O objetivo do acompanhamento terapêutico é tentar construir um vínculo com o paciente, facilitando a sua relação familiar e sua integração com as pessoas com quem convive (BAPTISTA, 2001).

A base familiar é de fundamental importância para a ação do AT. Wolkind e Ruttler (1990) endossam as evidências de que problemas que envolvem a estrutura ou o suporte familiar estão relacionados, particularmente, aos transtornos de humor, que atinge pessoas de todas as idades.

Para exercer sua atividade, o AT necessita de um ambiente privado, onde a relação com o paciente possa se estabelecer com o maior nível de confidencialidade e onde possam discutir suas dúvidas e conflitos. Isto, no entanto, não impede que o AT acompanhe o paciente em lugares públicos. Por meio de um processo que envolve o diálogo, capacidade de ouvir e buscando atividades que possam motivar o paciente a realizar tarefas e encontrar pessoas que o façam se sentir melhor.

O AT não deve “instruir” o paciente depressivo sobre como ou quando tomar decisões ou o que fazer, mas ajudá-lo a observar-se e a entender a situação em que se encontra. Com o auxílio do AT, o paciente poderá mudar seu comportamento em busca de melhor qualidade de vida.

O AT busca propiciar uma maior autonomia para que os pacientes possam conviver e se desenvolver como sujeitos criativos no seu próprio meio social e urbano, apesar dos limites e dificuldades individuais.

 


– A Família e Sua Influência no Comportamento

Famílias intactas tendem a favorecer maior estabilidade e afeto para seus filhos do que famílias reconstituídas ou divididas. PARISH E NECESSARY (1994) concluíram que estudantes vindos de famílias em que houve divórcio, possuíam uma avaliação mais negativa de seus pais do que aqueles provenientes de famílias intactas. Da mesma forma, os pais provenientes de famílias intactas perceberam mais afeto de suas esposas e deles próprios em relação aos filhos, do que os pais de famílias reconstituídas ou pais divorciados.

Os adolescentes, cujos genitores eram separados, tenderam a citar características próprias de desorganização, distração, descontrole e desatenção.

– Suporte Familiar

Os relacionamentos pessoais, os primeiros relacionamentos seguros e a relação pais-criança durante a infância propiciam um crescimento com sentimentos de maior auto-estima e auto-eficácia na vida de um indivíduo (ARO, 1994).

De acordo com Birtchnell (1988), uma das hipóteses mais prováveis provindas da aprendizagem sobre o suporte familiar e a depressão é que relacionamentos pobres na infância e na adolescência (pouco afeto provindo dos pais, estimulação, comunicação, etc.) contribuem de forma significativa para a aquisição de personalidades vulneráveis, que auxiliam na propensão para a depressão e para modelos insatisfatórios de relacionamentos.

Há amplas evidências de que problemas relacionados á estrutura e suporte familiar estão relacionados a desordens psiquiátricas infantis (WOLKIND e RUTTER, 1990), especificamente aos transtornos de humor.


CONCLUSÃO

Neste trabalho buscamos apresentar a atividade do AT com pacientes com depressão, amparados em poucas e repetitivas informações acadêmicas encontradas na literatura revisada ou na Internet.

A depressão pode estar presente em diferentes graus de intensidade. Desde situações que permitem que o paciente tenha assistência psicológica em consultório até situações nas quais há a indicação de internação em clínica especializada.

De acordo com a condição clínica do paciente, o AT pode ser um coadjuvante importante na recuperação do paciente depressivo e uma alternativa terapêutica que pode ajudá-lo a superar seus conflitos internos e a retomar projetos, propiciando-lhe bem estar e melhor qualidade de vida.

Observamos, também, uma grande limitação de conteúdo e informações sobre a ação e as responsabilidades do AT na depressão. Diante das inesgotáveis possibilidades que esta alternativa de tratamento pode oferecer a pacientes com depressão ou outras psicopatologias, entendemos que com estudos teóricos mais aprofundados e uma aplicação prática, monitorada por um profissional experiente, esta atividade pode vir a se tornar uma importante ferramenta terapêutica.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. DSM-IV-TR – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Trad. Dayse Batista. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
  • ARO, H. (1994). Risk and Protective Factors in Depression: a Developmental Perspective. Acta Psichiatrica Scandinavica, 89: 59 – 64.
  • BALLONE JB. 2011. Perguntas sobre…Depressão. Acessado em 30 de julho de 2011, endereço: http://gballone.sites.uol.com.br/voce/dep.html#1.
  • BAPTISTA MN, BAPTISTA ASD & DIAS RR. 2001. Estrutura e suporte como fatores de risco na depressão de adolescentes. Psicol. Cienc. Prof. 2;2:2001
  • BIRTCHNELL, J. (1988). Depression and Family Relantionships. A Study of Young, Married Women on a London Housing Estate. British Journal of Psychiatry, 153: 758 – 769.
  • CAMARGO, E. M. C. O acompanhante terapêutico e a clínica. In: A rua como espaço clínico: acompanhamento terapêutico. São Paulo: Escuta, 1991.
  • KAPLAN, H.I. e SADOCK, B.J. (1993). Compêndio de Psiquiatria. Trad. Dayse Batista. Porto Alegre: Artes Médicas.
  • MAUER SK e RESNEZKY S. 1987. Acompanhantes terapêuticos e pacientes psicóticos: manual introdutório de uma estratégia clínica (W.P. Rosa, Trad.). Campinas: Papirus.
  • PARISH, T.S. e NECESSARY, R. (1994). Do attitudinal and Behavioral Ratings of Family Members. Vary Across Familial Configurations  Adolescence, 29 (115): 649 – 652.
  • SILVA, A. L. B. P.; SILVA, M. B. P. S. Acompanhamento terapêutico: técnicas e ética. Crise e cidade: acompanhamento terapêutico. São Paulo: Educ, 2000.
  • STORESUM JG. 2001. Eur. Psychiatry; 16: 327-335 Relapse and Recurrence Prevention in Major Depression
  • WOLKIND S e RUTTER M. 1990. Separation, Loss and Family Relationship. In: M. Rutter e L. Hersoy. Child and Adolescent Psychiatry. Boston: Blackwell Scientific Publications.

Artigo publicado no “Site AT” em 05/10/2011.

Supervisão em AT.

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