Autor:
- Kleber Duarte Barretto – Acompanhante Terapêutico desde 1987, Psicólogo pelo Instituto de Psicologia da USP (1989); Mestre (1997) e Doutor (2002) em Psicologia Clínica pela PUC-SP; membro fundador da AAT- Associação de Acompanhamento Terapêutico e do LET-Laboratório de Estudos da Transicionalidade; criador (1998), líder e supervisor do Estagio em AT para os alunos de quinto ano do Curso de Psicologia da Universidade Paulista-UNIP; pesquisador no campo do AT pela UNIP tendo concluído dois projetos de pesquisa na área: Acompanhamento Terapêutico (1997-1998) e Estética e Po-Ética no Acompanhamento Terapêutico: veredas rosianas (2009-2011) e outro em andamento: Acompanhamento Terapêutico: configurações do mundo-da-vida e literatura (2011-2013). Autor do livro Ética e técnica no Acompanhamento Terapêutico: andanças com Don Quixote e Sancho Pança (Unimarco-Sobornost, 3ª edição). E-mail: [email protected]
El Acompañamiento Terapéutico (AT) es un procedimiento clínico cuya utilización se está incrementando – sobre todo en Argentina, Brasil y principiandose en España – en el tratamiento de pacientes que, por diversos motivos, tuvieron el processo de desarrollo psíquico interrumpido y/o paralizado. Por lo general, se lo utiliza cuando tratamos a una persona que encuentra dificultades o imposibilidades para cuidar de los aspectos básicos de su cotidiano: organizar sus pertenencias, ocio, estudios y/o trabajo.
Esta actividad (AT) se caracteriza por tener lugar fuera de los espacios tradicionales de tratamiento: consulta e instituciones. De modo que tenemos a acompañante (terapeuta) y acompañado (paciente) relacionándose y compartiendo experiencias en casa del paciente, calles, parques, cines etc. Este tipo de inserción abre todo un campo de intervenciones junto al paciente, utilizándose los potenciales terapéuticos de su vida cotidiana. A través de la comprensión de la história psíquica del paciente, de su familia y del proceso de la relación acompañante-acompañado, se puede manejar la transferencia y diversas situaciones, de tal modo que las mismas pueden (re)conectar el sujeto en un processo de simbolización.
Partiendo de las formulaciones de Winnicott acerca del espacio potencial y fenómenos transicionales, este procedimiento (AT) tiene por objetivo potenciar la dimensión simbólica presente en el cotidiano del sujeto, com el fin de recuperar o establecer aspectos, objetos, acciones que le representen significativamente y le ayuden a inscribirse de una forma simbólica en la realidad compartida (cultura).
1- Acompañamiento Terapéutico 2- Manejo Clínico 3- Winnicott 4-Psicoanálisis
THERAPEUTIC ACCOMPANIMENT: A CLINIC OF THE EVERYDAY LIFE
Kleber Duarte Barretto
The Therapeutic Accompaniment (T.A.) is a clinical procedure which is increasingly being used — mostly in Argentina, Brazil and beginning in Spain — in the treatment of patients that,for many reasons,have the psychic development process interrupted and/or paralysed. Usually, this occurs when we treat a person who has difficultes or impossibilities to take care of basic aspects of everyday life:organizing his (her) belongings, his entertainement, studies and/or work etc. This activity (T.A.) is caracterized for taking place outside the traditional treatment spaces:consulting-room and institutions. So we have, accompanist (therapist) and accompanied (patient) relating and sharing experiences at the patient’s home, in the streets, in a park, cinema theater etc.
This kind of insertion opens a whole field of interventions towards the patient utilizing the therapeutic potencialities of the patient’s everyday life. Through the comprehension of the patient’s psychic history, his family’s and the accompanist-accompanied relationship process, one is able to manage the transferance and several situations in such a way that they can (re)conect the subject into the symbolizing process.
From Winnicott’s formulations of potential space and transitional phenomena, this procedure (T.A.) aims to potentialize the subject’s everyday-life symbolic dimension in order to recover or establish aspects, objects, actions that represent himself significantly and help him to inscribe himself in a symbolic way in the shared reality (culture).
1- Therapeutic Accompaniment 2- Clinical Management 3- Winnicott 4- Psychoanalisis
Presentación: Kleber Duarte Barretto Formato: poster
ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO: UMA CLÍNICA DO COTIDIANO
Kleber Duarte Barretto
Possivelmente, o termo acompanhante terapêutico (at) não seja de todo estranho ao leitor. Talvez, tenha ouvido falar em amigo qualificado, o que nos coloca em um campo comum.
Penso que, inicialmente, seria importante contar um pouco da história deste procedimento clínico. O acompanhamento terapêutico (AT) surgiu no final da década de 60 em Buenos Aires (Argentina), a partir do trabalho com pacientes em hospitais psiquiátricos. Na década de 70 apareceu no Brasil, graças ao intercâmbio científico-cultural entre estes dois países, mas , principalmente, com a imigração de inúmeros psicanalistas decorrente da situação política argentina.
A princípio denominou-se amigo qualificado a pessoa que se dispunha a estar junto do paciente fora da instituição e auxiliá-lo em seus afazeres cotidianos quando necessário: ir a consultas médicas, ortodônticas ou terapêuticas; retomar atividades escolares ou profissionais e até mesmo organizar sua moradia e lazer. Devido a inúmeras confusões e visando a uma maior discriminação na relação, optou-se pela denominação: acompanhante terapêutico. Este processo ocorreu de forma semelhante nos dois países, porém, a mudança não se deu de maneira completa. Hoje em dia, encontramos as duas denominações, ao menos no que diz respeito ao Brasil, havendo uma predominância do termo at.
Mas, quais são os princípios que fundamentam uma prática clínica que se dá no cotidiano de um sujeito?
Vale ressaltar que o AT é herdeiro de todo um movimento na cultura ocidental, ocorrido neste século. O surgimento da psicanálise, da anti-psiquiatria, da psiquiatria dinâmica e outras correntes questionaram a noção de doença mental como decorrente de um fator unicamente orgânico (hereditário) e cujo tratamento se dava, principalmente, pela exclusão em manicômios. Abriu-se campo para a compreensão da constituição do psiquismo humano a partir de outros vértices: pulsionais (Freud, Klein, Lacan e outros), sociais (Basaglia), relação com o ambiente (Winnicott) e assim por diante.
Através deste movimento que se iniciou na Europa e E.U.A ., e que se difundiu por outras regiões, passou-se a valorizar a relação humana como o principal fator e recurso no desenvolvimento de um sujeito. É claro que diferentes autores enfatizarão distintas funções de um vínculo, como responsáveis pelo bem-estar psíquico.
Nesta perspectiva, no caso de uma crise aguda (psicótica) o tratamento não se restringe e/ou não se esgota no confinamento (isolamento) e medicação. Leva-se em conta o sujeito em suas dimensões afetivas, pulsionais, existenciais e sociais.
Na história da psicanálise, podemos reconhecer atitudes e procedimentos que em muito se assemelham à atividade que estamos procurando fundamentar. Freud, inicialmente, fazia sessões com certos pacientes durante caminhadas, passeios e/ou viagens. Ferenczi, propôs a análise ativa e também a recíproca, na qual aceitou a proposta de uma paciente para que se invertessem os papéis (analista/analisando) por um determinado tempo de cada sessão. Klein e Freud tiveram experiências de análise com os próprios filhos. Entretanto, os exemplos na literatura psicanalítica que nos fazem pensar diretamente no AT são os relatos das experiências clínicas de M. Sechehaye (1988), Winnicott (1984), Margaret Little (1990) e Khan (1991). Através dos relatos clínicos desses últimos autores, descobrimos que o trabalho com determinados sujeitos e/ou em determinadas dimensões do self, só é possível com a presença da pessoa real do analista. Este se implica com todos seus afetos e sua personalidade, lançando mão de recursos que transcendem a dimensão discursiva, tão privilegiada na cultura ocidental como campo simbólico por excelência. As formulações destes autores apontam para a dimensão simbólica presente nos objetos do cotidiano: objetos da cultura, tão simbólicos quanto a palavra.
Tive a oportunidade de acompanhar João, um rapaz de 22 anos, que viveu em um estado autístico grande parte de sua vida.
Ele teve um problema auditivo após o nascimento, que demorou a ser detectado e que só foi solucionado depois de uma operação. Outro fator a ser ressaltado foi o luto materno pela perda do pai e da mãe em um curto intervalo na época do nascimento do filho. Ele já contava com o trabalho de uma acompanhante e havia uma indicação de um at devido a necessidade de se ter uma figura masculina mais presente em seu cotidiano a fim de colocar limites e conter suas crises de birra, nas quais costumava fazer escândalos atirando-se no chão e, às vezes, se mordendo. Para os pais e, principalmente, para o pai – esta era uma tarefa impossível.
João apresentava ecolalia, o que para ele esta se transformou num jogo. Ele sempre emitia sons, aos quais as pessoas tinham de repetir. Após alguns anos de trabalho terapêutico com um analista, este se deu conta que João repetia as palavras ou frases, alterando o perfil melódico e quando o analista foi capaz de repetir exatamente a melodia proposta por ele, este entrou em júbilo. Ele (João) viveu uma experiência estética na qual pôde ser compreendido por um outro, houve uma comunicação verdadeira, ao ter sido encontrado na dimensão onde seu ser se ancora: a musicalidade. A partir desta experiência, observou-se uma saída gradual do estado autístico.
Tendo conhecimento dessas características, meu encontro com João foi bastante facilitado. Sempre que nos encontrávamos, durante um certo tempo, brincávamos de “ecolalia”. Quando conseguia repetir com perfeição pois nem sempre era capaz de acompanhá-lo na sua habilidade vocal para pronunciar frases, muitas vezes, intrincadíssimas –,ele tinha uma vivência de intensa alegria, que se expressava pelo riso, pelos pulos e corridas que dava.
Do ponto de vista winnicottiano, temos analista e at exercendo a função especular. Poder reconhecer-se e encontrar-se no rosto materno (função de espelho) é para o bebê , não só um momento integrador de sua imagem, mas se constitui naquilo que Safra (1995) denomina experiência estética. Esta seria dada pelo encontro com o outro ou com algum objeto da cultura. O reconhecimento e o encontro do ser, não se dá, somente, através da imagem, mas pode ser pelo som, pela fala, pelo gesto etc.
Segundo o autor acima citado, cada um de nós privilegia um órgão sensorial; e, é aí, que ancoramos nosso self; é aí que habitamos preferencialmente. Foi a partir desta compreensão que se afirmou que João existe, fundamentalmente, na musicalidade.
Logo após nosso primeiro encontro, notei que João passou a tomar o at como modelo de identificação. Esperou-me calçando um mocassim, algo raríssimo, segundo a mãe, pois seu habitual era estar sempre de chinelos. Observei que passou a usar tênis ou mocassim em nossos encontros. Porém, o elemento mais significativo mobilizado depois do primeiro encontro foi o fato dele se lembrar de passeios que realizou quando era bem pequeno. Lembrou-se de um amigo da família que o levava para passear e que costumavam freqüentar uma determinada lanchonete. Os pais o levaram a uma lanchonete, mas João disse que aquela não era a lanchonete que ele costumava ir. Havia necessidade de se encontrar esta lanchonete específica, o que os pais conseguiram ao longo da semana. Assim, em nosso segundo encontro fomos a este lugar, passeio que se repetiu inúmeras vezes. Ele sempre pedia os mesmos alimentos, os quais eram praticamente devorados.
Entretanto, o que ocorria de mais interessante é que inúmeras vezes, enquanto ele engolia os alimentos e observava o ambiente, eu notava que algumas lágrimas corriam pelo seu rosto. Penso que as lágrimas eram fruto da dor provocada pela maior consciência do tempo e de si mesmo.
Neste breve relato podemos observar algumas das inúmeras funções que o at exerce junto a um sujeito (Barretto, 1998): especular, de modelo de identificação e de resgate de experiências significativas (história). O at funciona em determinado momento como mãe, em outros como pai e também como amigo.
Certo dia, estava descendo uma rua a pé, cuja calçada é repleta de degraus devido à sua inclinação. Caminhava e ao longe avistei duas pessoas sentadas em um desses degraus. Ao ver aquela cena, imediatamente pensei se tratar de um acompanhante e seu acompanhado, pois o local e o horário eram pouco “apropriados” para se estar conversando. Para tal suposição, baseava-me nas inúmeras vezes que sentei , ao lado de um(a) acompanhado(a), em guias ou chão de uma calçada qualquer.
Quando me aproximei, não resisti à curiosidade e procurei observar os protagonistas daquela cena. Qual não foi minha surpresa quando notei que aquela dupla, alheia à movimentação local, parecia mais tratar-se de um encontro entre pai e filho. Era um garoto em sua puberdade e um homem adulto. Imaginei que estivessem tentando dar conta de algum conflito. A bem da verdade, pouco importa se minha imaginação se aproximou daquilo que envolvia aquelas duas pessoas. O mais importante, e por isso estou contando este episódio, foi a repercussão que esta cena teve em mim. Era evidente que não se tratava de um at e seu acompanhado, tampouco, um amigo qualificado. Isto me fez pensar no quanto exercemos uma função que está enraizada no cotidiano, na vida das pessoas. O AT é uma ajuda especializada em funções que pertencem à vida mesmo.
Tentamos potencializar aquilo que está – esteve ou deveria estar — presente na vida de cada um.
Referências Bibliográficas:
- Barretto, K (1998). Ética e Técnica no Acompanhamento Terapêutico: Andanças com Dom Quixote e Sancho Pança. São Paulo: Unimarco.
- Barretto, K (1997). Acompanhamento Terapêutico: Uma Clínica do Cotidiano. Insight Psicoterapia, VII(73), 22-24.
- Equipe de AT do Hospital-Dia “A CASA” (Ed.) (1991). A Rua como Espaço Clínico: Acompanhamento Terapêutico. São Paulo: Escuta.
- Khan, M. (1991). Quando a Primavera Chegar. São Paulo: Escuta.
- Little, M. (1990). Psychotic Anxieties and Containment: A Personal Record of an Analysis with Winnicott. London: J. Aranson.
- Mauer, S. e Resnizky, S. (1987). Acompanhantes Terapêuticos e Pacientes Psicóticos. Campinas: Papirus.
- Safra, G. (1995). Momentos Mutativos em Psicanálise: Uma Visão Winnicottiana. São Paulo: Casa do Psicólogo.
- Sechehaye, M.A. (1988). La Realización Simbólica y Diario de una Esquizofrénica. México, D.F.: Fondo de Cultura Económica.
- Winnicott, D.W. (1984). Deprivation and Delinquency. London: Tavistock.
Fonte:
http://copsa.cop.es/congresoiberoa/base/clinica/ct169.htm
Artigo publicado no “Site AT” em 26/06/2001.
Tags:Acompañamiento Terapéutico, amigo qualificado, autismo, psicose, Winnicott
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