A percepção dos psicólogos acerca da inserção do acompanhante terapêutico no tratamento de transtornos mentais

Resumo: este estudo buscou investigar a percepção dos psicólogos sobre a importância da inserção do Acompanhamento Terapêutico (AT) no tratamento de paciente com transtornos mentais.  Trata-se de um estudo misto. Na análise quantitativa participaram 68 psicólogos de Porto Alegre e grande Porto Alegre que respondessem um questionário fechado contendo 15 questões sobre seu conhecimento e percepção do AT. Para a coleta de dados qualitativa participaram 3 psicólogos do Brasil e da Argentina, onde foi utilizado um questionário com 11 questões abertas referentes a questões sobre à percepção e experiência sobre a prática do AT. Os instrumentos utilizados foram aplicados via internet. No estudo quantitativo os resultados mostraram que essa modalidade de tratamento ainda carece de mais esclarecimentos sobre qual a utilidade do AT, para quais casos é indicado e, também como se dá a sua prática. No estudo qualitativo, a análise de conteúdo possibilitou a formação de 7categorias, referentes a questões como formação necessária para o trabalho de AT, as funções do acompanhante terapêutico para com o paciente, e a importância da sua participação na equipe interdisciplinar.

Palavras-chave: Acompanhamento Terapêutico, Clínica, Transtornos mentais.

Perception of Psychologists on the insertion of the therapeutic accompaniment in the treatment of mental disorders.

Abstract

This study sought to investigate the perception of psychologists on the importance of inserting the Therapeutic accompaniment of patients with mental disorders. It is a joint study. The quantitative analysis 68 psychologists participated in Porto Alegre and Porto Alegre to answer a questionnaire containing 15 closed questions about their knowledge and awareness of TA. For qualitative data collection involved three psychologists in Brazil and Argentina, where it was used a questionnaire with 11 open questions regarding questions about the perception and experience of the practice of TA. The instruments used were applied via the Internet. In the quantitative study results showed that this treatment modality still needs more clarification on what is the use of AT, for which case is indicated, and also how to give your practice. In the study qualitative content analysis allowed the formation of 7categorias relating to issues such as training required for the work of TA, the functions of the therapeutic accompaniment to the patient and the importance of their participation in the interdisciplinary team.

Keywords: Therapeutic accompaniment; Clinic, Mental disorders.

A Percepção dos Psicólogos acerca da inserção do acompanhante terapêutico no tratamento de transtornos mentais.1

Introdução

O Acompanhamento Terapêutico é um campo que vem tendo um importante destaque na área da saúde mental. Oriundo dos movimentos da Antipsiquiatria e da Reforma Psiquiátrica, o Acompanhamento Terapêutico surge num movimento de humanização àqueles que viviam isolados em instituições manicomiais (Alves e Brum, 2006; Londero e Pacheco, 2006; Pitiá e Santos, 2005; Silva, 2005).

Se, antigamente, o trabalho do Acompanhante Terapêutico estava direcionado somente ao cuidado de pacientes com patologias graves, onde era realizado um trabalho para cuidar da medicação desses pacientes e de sua conduta, hoje, seu objetivo de trabalho foi ampliado.

De acordo com a equipe de Acompanhantes Terapêuticos do Hospital – Dia A Casa, o trabalho do (AT) é descrito como um tipo de acolhimento que auxilia na recolocação do sujeito na sociedade e na realidade urbana através de saídas fora do ambiente hospitalar e de casa, propondo ao sujeito uma nova maneira de experimentar esses espaços de uma forma mais saudável (A Rua como espaço clínico: acompanhamento terapêutico, 1991).

Atualmente, essa modalidade é uma prática que não se restringe somente à pacientes psicóticos, mas se estende a uma série de sujeitos que, de uma forma ou outra possuem dificuldades para estarem vivenciando de forma saudável a convivência em sociedade como, por exemplo, pacientes com diagnóstico de dependência química, retardo mental, personalidade borderline ou qualquer outra psicopatologia grave.

Ao realizar o trabalho junto a estes pacientes, o acompanhante acaba se inserindo em uma série de atravessamentos que vão desde a esfera familiar, passando pela institucional até a esfera social.  Este profissional faz uma articulação entre todas essas esferas com o propósito de ajudar o paciente a resgatar seus laços sociais, ajudá-lo a se movimentar, saindo da solidão para vir a ser um sujeito desejante e participante de todas as esferas sociais de forma mais saudável (Londero e Pacheco, 2006; Pitiá e Santos, 2005; Rebello, L. 2006; Rossi, 2005; Silva, A. 2005).

Em relação às funções do AT, autoras Mauer e Resnizky (em Londero, e Pacheco, 2006) apontam as principais funções do acompanhante terapêutico como sendo: 1) conter o paciente; 2) oferecer-se como modelo de identificação; 3) trabalhar em nível dramático vivencial e não interpretativo; 4) emprestar o “ego”; 5) perceber, reforçar e desenvolver a capacidade criativa do paciente; 6) informar sobre o mundo objetivo do paciente; 7) representar o terapeuta; 8) atuar como agente ressocializador; e 9) servir como catalisador das relações familiares.

Acompanhamento Terapêutico e inserção na equipe interdisciplinar

Para Pitiá e Furegato (2008), os profissionais que desejam trabalhar com a prática AT precisam de formação e estudos que os preparem para realizar esta atividade clínica, sendo importante uma formação específica (a função de acompanhantes terapêuticos). Para outros autores, o profissional, acompanhante terapêutico não está atrelado a uma profissão em particular, mas necessita de qualificação específica para exercício dessa prática profissionalmente (Pitiá, Santos, 2005; Berger, 1997).

Apesar de o acompanhamento terapêutico ter surgido através de uma demanda percebida pelos profissionais de saúde, em sua maioria psiquiatras, atualmente percebe-se uma dificuldade do mesmo para se inserir de forma adequada nas equipes multidisciplinares e há pouco esclarecimento acerca de como se dá a prática do AT, pois existe uma distorção tanto vinda das famílias, que percebem o trabalho do AT como somente uma atividade de lazer e das instituições de saúde que podem não dar a devida importância para o trabalho do AT (Alves e Brum, 2006).

As autoras atentam ainda para a questão de que o Acompanhamento Terapêutico é desconhecido das instituições de saúde e que este trabalho carece de justificação, pois, a demanda das instituições para o início do tratamento poderá ser, em muitos casos, indefinida, sendo constituída apenas no desejo de que o paciente possa usufruir de um novo tipo de tratamento, qualquer que ele seja. (Alves, K e Brum, C, 2006).

É preciso então levar informação sobre o que é Acompanhamento Terapêutico e como funciona o trabalho do acompanhante terapêutico com o paciente, sua família e até com a instituição ao qual se vincula, para que esteja esclarecida a função deste trabalho, pois o AT é considerado um importante recurso clínico para auxiliar no processo de socialização.

Justificativa

Através deste estudo, se busca poder compreender qual a percepção e entendimento que os psicólogos possuem sobre o Acompanhamento Terapêutico. Visto que, o AT é uma importante área da saúde mental (Mauer e Resnizky, 1987; Pitiá e Santos, 2005;), também se pretende contribuir para acrescentar a atual bibliografia sobre o tema. Este estudo, além de beneficiar a comunidade científica e contribuir para o crescimento bibliográfico do AT, também poderá auxiliar profissionais e pacientes com os benefícios desta modalidade de tratamento.

O uso deste dispositivo de tratamento em parceria com redes comunitárias pode auxiliar o paciente, levando em conta a sua singularidade para compor de maneira individualizada a ligação entre o político (nesse caso as instituições de saúde) e o sujeito (paciente) com os laços sociais envolvidos, que está relacionado à interação do sujeito com a sociedade. (Rossi, 2005)

Objetivos

Qual a percepção dos psicólogos acerca da importância da inserção do acompanhante terapêutico no tratamento de pacientes com transtornos mentais?

Objetivos específicos

  1. Compreender o que é Acompanhamento Terapêutico na visão dos Psicólogos;
  2. Entender qual a importância que o psicólogo expressa acerca da prática do Acompanhamento Terapêutico;
  3. Saber quais motivos que levam os psicólogos a encaminharem pacientes para Acompanhamento Terapêutico;
  4. Identificar os quadros psicopatológicos encaminhados pelos psicólogos para o Acompanhamento Terapêutico.

Método

Delineamento

Trata-se de uma pesquisa qualitativa e quantitativa observacional transversal de cunho exploratório, que é um delineamento na qual se pretende, de acordo com Câmara e Carlotto (2007), compreender um fenômeno, através de uma exploração que será através da experiência dos participantes da pesquisa.

Participantes

Para o estudo quantitativo (estudo 1) participaram psicólogos formados de Porto Alegre e da região metropolitana de Porto Alegre que atuem nas diversas áreas da psicologia. Os profissionais foram selecionados por acessibilidade.

Já para a abordagem qualitativa (estudo 2) foi utilizada uma amostragem por conveniência onde foram selecionados intencionalmente três psicólogos após atenderem os seguintes critérios: formação em Psicologia; trabalhar em equipe multidisciplinar; ter experiência em atendimento de pacientes graves junto com o acompanhante terapêutico e estar formado há, no mínimo, dois anos.

Instrumentos

Para o estudo 1 utilizou-se um questionário fechado, com 15 questões referentes ao Acompanhamento Terapêutico e as funções do AT. O instrumento foi enviado para os participantes por e-mail, junto com termo de consentimento, explicações para preenchimento e formas de contato com as pesquisadoras.

Já no estudo 2, utilizou-se um questionário semi-estruturado com 11 questões abertas referentes à experiência dos participantes sobre a prática e funções do Acompanhamento Terapêutico, também enviado por e-mail, com instruções para preenchimento, bem como termo de consentimento e contato com as pesquisadoras.

Procedimento de coleta de dados

O estudo foi delineado para ser realizado através da tecnologia virtual. Os instrumentos foram enviados por e-mail com as devidas orientações e termo de consentimento livre e esclarecido. Foi feito contato com clínicas de atendimento e ensino psicológicos e contato com coordenação de cursos de psicologia, explicando a pesquisa, seus objetivos e solicitando e-mails de profissionais para participarem do estudo.

Além disso, também se solicitou indicação de profissionais que atuam na área. Tendo em mãos os endereços de e-mail foi enviado convite para participação juntamente com os questionários contendo a apresentação da pesquisadora e sua orientadora, formas de contato, termo de consentimento e explicações para o preenchimento do instrumento. Os profissionais que aceitaram participar do estudo respondiam e retornavam por e-mail os questionários. Em relação ao estudo de abordagem qualitativa, foram enviados somente 3 questionários para os profissionais que atenderam os critérios de inclusão.

Apresentação dos resultados

Para análise dos dados quantitativos utilizou-se o programa Statistical Package for the Social Science (SPSS). As variáveis individuais foram descritas por números absolutos percentuais, média e desvio padrão.

Foram enviados, ao todo 226 questionários via e-mail e obteve-se retorno de 68 questionários (30,0%). Em relação às características dos participantes 62 (91,2%) tinham idade de 36,8 anos ± 9,7, a maioria era do sexo feminino (91,2%).

No que se refere ao tempo de formação, 21 (38,9%) estavam formados há até 5 anos e 20 (37,0%) há mais de 10 anos. Quando analisado se estes possuíam pós-graduação, 82,4% afirmaram positivamente.  No que diz respeito à área de atuação dos participantes observou-se que muitos atuavam em mais de uma área, sendo as principais, a área clínica (88,2%), seguida da organizacional (16,2%) e da docência (13,2%).

Em relação à percepção e o conhecimento que os participantes possuem sobre o Acompanhamento Terapêutico, 100% afirmam já terem ouvido falar sobre AT.

Quando questionados sobre como souberam sobre o Acompanhamento Terapêutico, 44 participantes (65,7%) ficaram sabendo através da graduação; 22 participantes (32,8%) tiveram conhecimento através de congressos; 30 participantes (44,8%) tiveram conhecimento através de um colega que já trabalhou com um acompanhante terapêutico e 28 participantes (41,8%) conhecem um acompanhante terapêutico. Os dados sobre as características da amostra são apresentados na tabela 1.

 Tabela 1

 

 Descrição das características dos psicólogos entrevistados

     
Variáveis n %      
 
Sexo
feminino 62 91,2
masculino 6 8,8
Idade
de 20 a 30 anos 9 13,2
acima de 31 anos 59 86,8
Tempo de formação
até 5 anos 21 38,9
de 6 a 10 anos 13 24,1
mais de 10 anos 20 37,0
 
Possui pós-graduação
Sim 56 82,4
Não 12 17,6
 
Área de atuação
clínica 60 88,2
organizacional 11 16,2
escolar 4 5,9
comunitária 5 7,4
docência 9 13,2
hospitalar 1 1,5
pesquisa 3 4,4
neuropsicologia 1 1,5
jurídica 1 1,5
esporte 1 1,5
sistema prisional 1 1,5
saúde pública 1 1,5

Na tabela 2 abaixo, seguem os dados sobre a forma como os profissionais conheceram o AT.

Na questão se os participantes sabem como é realizado o trabalho de AT, 60 participantes (89,6%) responderam afirmativamente.

Quando questionados se consideram importante a prática do AT, 68 participantes (100,0%) consideram importante esta modalidade de atendimento e quando questionados se acreditam que o AT pode auxiliar nos tratamentos de transtornos mentais, 68 participantes (100,0%) responderam que sim.

Sobre quais os transtornos mais indicados para utilização do AT, as respostas foram: transtornos de infância e adolescência, psicóticos, dependência química, retardo mental, e transtornos leves, enquanto que transtornos como os da aprendizagem, transtorno do humor, transtornos alimentares, transtorno de personalidade, receberam poucas indicações.

Levando-se em conta que esta questão no questionário era de múltipla escolha e que 61,8% dos participantes indicariam o trabalho do AT para todos os transtornos listados, foi percebido que transtornos que receberam pouca indicação como, por exemplo, o da aprendizagem e o bipolar, atualmente fazem parte dos transtornos onde a inserção do Acompanhamento Terapêutico é importante.

A questão relativa à idade que os participantes consideram importante para encaminhar pacientes para o AT obteve as seguintes respostas: nenhum participante indicou encaminhamentos somente na infância; 1 participante (1,5%) acredita que se faz encaminhamento para adolescentes; 2 participantes (2,9%) responderam que se fazem encaminhamentos na idade adulta; 2 participantes (2,9%) responderam que se faz encaminhamentos para idosos e 66 participantes (97,1%) acreditam que em qualquer faixa etária pode ser indicada para se fazer encaminhamentos para o AT.

Quando questionados se o trabalho do AT pode ser combinado junto a outros tratamentos como psicológico e psiquiátrico, 57 participantes (83,8%) responderam que sim.

Sobre os benefícios da participação do acompanhante em tratamentos combinados, 57 participantes (83,8%) acreditam que o AT complementa o trabalho do psiquiatra e psicólogo; 55 dos participantes (80,9%) afirmaram que um dos benefícios do AT é poder trabalhar fora do setting do psicólogo e do psiquiatra; 46 participantes (67,6%) responderam que o AT pode levar informações percebidas nos ambientes que o paciente circula (ex: casa, no supermercado) para psicólogo e psiquiatra que atuam no tratamento combinado; e 39 participantes (57,4%) acreditam que o acompanhante terapêutico pode auxiliar no processo de mudança de instituições ou terapeutas, dando suporte para o paciente iniciar novos contratos clínicos.

Sobre as funções que os psicólogos acreditam que o AT exerce na sua prática no atendimento com o paciente as respostas foram as seguintes: trabalha com o treinamento de habilidades sociais (91,2%), trabalha com a melhora da autoestima (92,6%), trabalha com prevenção de recaídas esse (83,8%) e auxiliar a família a poder lidar melhor com o paciente (77,9%). As funções que tiveram menores indicações foras as seguintes: leva o paciente da casa para clínica ou consultas (27,9%), realiza atividades na casa do paciente (47,1%) e torna as saídas terapêuticas (48,5%).

Tabela 2

 

 Descrição da forma que os psicólogos conheceram AT

 
Variáveis n %
Conhece como é realizado o trabalho de AT
Sim 60 89,6
Não 7 10,4
Como ficou sabendo do AT
graduação 44 65,7
local de trabalho 18 26,9
artigos 17 25,4
congressos 22 32,8
conhece prof que trabalhou com AT 30 44,8
conhece um AT 28 41,8
Considera importante o trabalho de AT
Sim 68 100,0
Não
Acredita q pode auxiliar no tt de trans mentais
Sim 68 100,0
Não
Acha q at pode ser combinado a outros tts
Sim 57 83,8
Não
Complementa psic e psiqui 57 83,8
Sim
Não
Trabalha fora do setting 55 80,9
Sim
Não
Complementa com inf fora setting 46 67,6
Sim
Não
Auxilia na mudança de tratamento 39 57,4
Sim
Não
Pode auxiliar no tratamento
de Transtornos Mentais
inf e ado 21 30,9
aprendizagem 12 17,6
ansiedade 15 22,1
humor 11 16,2
alimentares 13 19,1
dep qui 22 32,4
psicóticos 27 39,7
Tp 13 19,1
retardo 22 32,4
transt leves 22 32,4
transt moderados 5 7,4
transt graves 11 16,2
todos os transtornos 42 61,8
Em que idade se encaminha para AT
somente infância 0 0,0
somente adolescência 1 1,5
somente adultos 2 2,9
somente idosos 2 2,9
qualquer faixa etária 66 97,1
Funções que acredita que o AT exerce
trabalha com pctes psicóticos 3 4,4
acompanha pctes casa, clinica, consulta 19 27,9
faz contenção qdo risco 35 51,5
trabalha com diversas patologias add dep qui 49 72,1
somente leva para passear 28 41,2
torna saídas terapêuticas 33 48,5
trabalha com treinamento de HS 62 91,2
trabalha com PR 57 83,8
trabalha para desenvolvimento da autonomia 55 80,9
auxilia na internação HD 51 75
auxilia internação domi 44 64,7
auxilia internação psiq 41 60,3
trabalha reinserção social 52 76,5
melhora da autoestima 63 92,6
usa téc cog-comp 50 73,5
insight 40 58,8
ego auxiliar 42 61,8
auxilia família 53 77,9
intervenção com a família 50 73,5
semelhante psicoterapia 32 47,1
somente consultório 8 11,8
somente lugares públicos 1 1,5
somente clinicas 4 5,9
realiza atividades na casa do pcte 32 47,1
faz acompanhamento na escola com pcte 48 70,6

Discussão dos resultados quantitativos

A maioria dos participantes deste estudo era do sexo feminino.

Foi possível perceber que a maioria dos profissionais teve conhecimento sobre o Acompanhamento Terapêutico através das suas graduações, o que confirma o que se encontra na literatura, onde Zamignani e Wielenska (1999) em Londero e Pacheco, 2005, apontam sobre a procura por estudantes da graduação e profissionais recém-formados para exercerem este tipo de trabalho, uma vez que a expectativa de remuneração é menor.

As questões relativas à importância do AT para auxiliar em tratamentos mostrou que todos os participantes consideram importante o uso do AT. Esses dados vão ao encontro ao que a literatura traz sobre a participação e benefícios do acompanhante terapêutico no tratamento de transtornos mentais e sua inclusão numa equipe interdisciplinar como coloca Yagiu (2006) ao ressaltar a importância da inserção do AT em equipes interdisciplinares, devido ao planejamento do tratamento em conjunto.

Mauer e Resnizky (1987) em Pitiá e Santos (2001) referem que o AT inserido numa equipe de enfoque interdisciplinar, se inclui como um agente terapêutico que, através dos atendimentos fora da instituição “procura restituir a possibilidade de diálogo entre o lado irracional do indivíduo e o senso comum da sociedade”.

Na questão que procurava saber em quais transtornos psíquicos o AT era indicado, o resultado mostra que existe uma contradição em relação ao conhecimento que os profissionais possuem sobre como funciona o trabalho do acompanhante terapêutico, ou que seu conhecimento sobre as indicações para o AT está defasado, uma vez que, quando surgiu o Acompanhamento Terapêutico, esta modalidade de tratamento era destinada a pacientes de manicômios (psicóticos ou pacientes que apresentassem algum tipo de risco aos outros e a si mesmos) e hoje em dia, o AT comtempla uma variedade de transtornos, que vão desde os psicóticos, passando pela dependência química e transtorno bipolar, até transtornos de personalidade e de aprendizagem, já que o trabalho do AT está voltado á melhor adaptação do sujeito ao ambiente onde vive e uma reinserção social (Londero e Pacheco, 2006; Pitiá e Santos, 2005; Rebello, L. 2006; Rossi, 2005; Silva, A. 2005).

Carvalho (2004, p.23) em Berlinck (2011) cita que “predominantemente o Acompanhamento Terapêutico tem sido um recurso utilizado no tratamento de pacientes diagnosticados como psicóticos, sendo, entretanto, cada vez mais indicado para pacientes com outros diagnósticos”.

Na questão referente às funções que eram pertinentes ao AT, o resultado mostra que as funções mais indicadas pelos participantes estavam relacionadas ao cuidado do AT para com o paciente e funções onde o AT ajuda no resgate da individualidade do paciente, tais como trabalhar a autoestima e desenvolvimento de habilidades sociais.

Essas funções importantes no trabalho do AT estão relacionadas com o que sugere Carvalho (2004) em Berlinck (2011) são aquelas que estão relacionadas ao “resgate e a promoção da circulação do paciente pela cidade, construindo ou simplesmente explorando redes sociais preexistentes”.

As questões sobre a importância da participação do AT em tratamentos combinados mostra que os participantes, na sua maioria, acreditam que é importante a entrada do AT e que traz benefícios, podendo auxiliar psicólogos e psiquiatras em tratamentos.

Esses dados sobre a inserção do AT na equipe interdisciplinar vêm de encontro com a literatura, apontando que a inserção do AT numa equipe interdisciplinar é benéfica, pois, de acordo com Yagiu (2006), a vantagem de se trabalha com o AT inserido numa equipe está na contribuição que cada profissional pode dar para fazer o planejamento do tratamento em conjunto, além de prever dificuldades que poderão surgir.

Essa colocação do autor mostra que a participação do AT na equipe pode auxiliar no delineamento de um plano de tratamento, além de também, o AT poder colaborar levando informações do cotidiano do paciente para a equipe.

Através das questões referentes à participação do Acompanhamento Terapêutico em tratamentos combinados, foi possível perceber através dos dados levantados que os participantes consideram importante a inserção do acompanhante terapêutico no trabalho junto a equipes interdisciplinares, tanto pelo acompanhante terapêutico, como o profissional que está mais próximo do cotidiano do paciente poder levar informações para os profissionais que integram a equipe, quanto para exercer funções de cuidado para com o paciente, já que ele está mais próximo do mesmo e da sua família.

Qual a percepção dos Psicólogos sobre a inserção do AT em tratamento de transtornos mentais?

Para o estudo qualitativo foram enviados 11 questionários abertos. Ao todo foi obtido o retorno de 3 questionários.

Através da técnica da Análise de Conteúdo de Bardin (1988), puderam ser construídas as seguintes categorias:

Categoria 1: Regulamentação do AT

Nesta categoria foram incluídas falas dos participantes relacionadas à regulamentação da prática do Acompanhamento Terapêutico tanto no Brasil quanto na Argentina. Observou-se que a prática do Acompanhamento Terapêutico não possui regulamentação no Brasil, sendo, ainda, uma prática realizada de maneira informal. “A formação necessária no Brasil ainda é informal, não sendo privativa a determinada profissão.” (participante 1)

Na Argentina foi observado que a prática do AT não possui uma legislação que regulamente o exercício da profissão, porém foi criado há um ano, um código de ética para orientar na prática dessa modalidade de tratamento, mostrando um avanço, em relação ao Brasil, para regulamentar esse dispositivo. “A AATRA (Asociación de Acompañantes Terapéuticos de la Republica Argentina) aprobo um codigo de ética que intenta orientar a los at’s pero al no haber ley no aplicar com rigurosidad (aun).” (participante 2)

Através da análise das falas é possível perceber que existem diferenças na maneira em como o exercício do AT é visto nos dois países. Em relação ao código de ética Argentino, este documento não possui nenhuma lei legislativa que obrigue o seguimento do código. O código foi desenvolvido com intensões de ser seguido, porém não existe, ainda, nenhuma lei ou portaria que exija o cumprimento dele. 

Categoria 2: Formação Profissional.

Nesta categoria, se formou uma subcategoria, perfil do AT.

Nesta categoria foram descritas as falas onde os participantes destacam os requisitos necessários para o profissional que trabalha, ou desejam trabalhar como AT.

Em relação á formação profissional os participantes destacam a importância de o AT possuir conhecimentos teóricos e técnicos sobre a demanda que pretende atender e também, noções de psicologia evolutiva, psicopatologia, transferência e contratransferência. Além disso, foi relatada a importância de se possuir experiência em atendimento a pacientes, sendo essa prática supervisionada, e também a importância de estar realizando terapia pessoal.

Carvalho (2004) ressalta a importância de se estar realizando tratamento pessoal e supervisão dos casos para se fazer AT. A autora também salienta sobre a importância da formação, não necessariamente em Psicologia, para se realizar esse trabalho de uma forma ética e profissional. Além do estudo e aperfeiçoamento constante, é importante que o AT busque conhecimentos de outras áreas como filosofia e psiquiatria, por exemplo, e também conhecimentos de cunho cultural que poderão auxiliar na sua formação e sua interação com o paciente.

“Esa capacitación deberá incluir nociones acerca de la salud y la patología mental, el desarrollo del psiquismo, psicologia evolutiva, psicoterapias, el fenômeno de la transferência y la contratransferência, trabajo em equipo […] Para ser acompanhante se debe tener uma formación especifica, si no tiene formación previa de al menos de dos años y médio três, si viene de alguma carrera de la salud um año, ambas com práticas com pacientes y supervisiones.”(participante 2)

“[…] diretamente ligada à população e demanda que determinado profissional irá atender. Por exemplo, psicologia – saúde mental; pedagogia – aprendizagem; terapia ocupacional – necessidades especiais; serviço social – inclusão social de vulneráveis.” (participante 1)

Na subcategoria perfil do AT, os profissionais, através de seus relatos, traçaram um perfil, com características e habilidades que consideram importantes para o profissional que exerce esta modalidade de tratamento.

Durante a análise foi percebido que os participantes consideram importante que o profissional seja uma pessoa aberta a novidades e desafios, que esteja disposto a atuar nas adversidades do cotidiano que surgirem, seja com o paciente, ou com sua família e seus atravessamentos. “[…] um profissional que gosta de desafios aberto a novidades e não acomodado com ideias pré estabelecidas e preconceitos.” (participante 1)

Em relação à formação profissional para exercer a prática do acompanhamento terapêutico, alguns autores (Pitiá, Santos, 2005; Berger, 1997) referem que o profissional não está atrelado a uma profissão em particular, mas necessita de qualificação específica para exercício dessa prática profissionalmente, ou seja, para exercer a prática do Acompanhamento Terapêutico é imprescindível que o profissional tenha uma qualificação e preparo específicos para a sua área de atuação. Esse posicionamento dos autores vem de encontro às falas dos participantes sobre a formação precisa para ser acompanhante terapêutico.

Essa importância lançada ao perfil do profissional pode estar relacionada ao fato de que, como o acompanhante terapêutico é uma pessoa que estará na “rua” com o paciente, enfrentando as adversidades do dia-a-dia, é imprescindível que se espere que este profissional seja uma pessoa aberta a desafios, que trabalhe desprendido de preconceitos e estereótipos, que seja autônomo e aja com plasticidade, no que se refere a poder se adaptar tanto ao paciente quanto às adversidades que podem ocorrer no cotidiano do paciente que ele irá acompanhar, além de ser uma pessoa que tenha capacidade de estabelecer vínculos para realizar seu trabalho. (Mauer & Resnizky, 1987).

Categoria 3: Objetivos do uso do AT.

Esta categoria inclui falas relacionadas aos objetivos da inclusão do AT nos tratamentos. Foi percebido que alguns dos objetivos da entrada deste profissional em tratamentos estão relacionados ao elo que o AT pode fazer entre o paciente e o ambiente onde ele está inserido. O AT, através da sua proximidade com o mundo do paciente pode auxiliá-lo em suas dificuldades de se inserir no seu ambiente, resgatando/ melhorando a convivência do mesmo com sua família, amigos ou colegas. Este vínculo mais próximo permite que o AT possa servir de modelo para o paciente, onde este pode experimentar e vivenciar uma nova maneira de se relacionar.

Outro objetivo do uso do AT seria o de que este profissional pode auxiliar o paciente em realizar ou reestabelecer tarefas do cotidiano na qual ele tem dificuldade para realizar. Outro objetivo seria o de o AT complementar o tratamento, junto a outras modalidades terapêuticas. “[…] importante para auxiliar o sujeito que necessita manter ou reestabelecer tarefas cotidianas. Também serve como tratamento complementar aos demais profissionais.” (participante 3)

“Pode contribuir como uma modalidade terapêutica complementar às modalidades tradicionais (psiquiatria clínica e psicoterapia ambulatorial) quando se faz necessária uma intervenção mais ativa e vivencial.” (participante 1)

Segundo Mauer e Resnizky (em Pitiá e Santos, 2006) o objetivo do acompanhamento Terapêutico é auxiliar numa interação mais saudável entre paciente e ambiente, referindo-se a um contexto biopsicossocial.

Ainda sobre os objetivos do AT, a equipe de Acompanhantes Terapêuticos do Hospital – Dia A Casa, em seu livro A rua como espaço clínico: acompanhamento terapêutico (1991) define em seu livro o “[…] forma de acolhimento que opera na produção da (re) colocação do sujeito na realidade urbana, encontrando espaços onde a cidade incorpora a conexão da pessoa à sua organização psíquica e à dinâmica social.”

Através das falas dos participantes e o que alguns autores relatam sobre o tema, os objetivos da entrada de um acompanhante terapêutico num tratamento estão ligados aos benefícios do uso deste profissional para auxiliar aqueles que estão acometidos por alguma dificuldade, seja em seus relacionamentos, à sua autonomia, isolamento, ou na realização de tarefas do cotidiano para ajudar estes sujeitos a resgatarem seus laços sociais, poderem adquirir autonomia para realizar tarefas básicas do dia-a-dia.

Carvalho (2004), refere que uma das finalidades que se busca na prática do AT é a possibilidade de experimentar novas maneiras de estar no mundo. Junto com o AT o paciente pode construir e desconstruir possibilidades de se relacionar com o ambiente a sua volta, assim como poder desempenhar novos papéis sócias. Dessa maneira, a paciente tem a oportunidade de criar um novo mundo junto com o AT, que o estará acompanhando nessas vivências, lhe dando o suporte necessário para fazer essas experimentações.

Categoria 4: Indicação dos profissionais para uso do AT.

Nesta categoria foram incluídas falas relacionadas às indicações que os participantes fazem para AT. Foi percebido que os profissionais buscam o AT para auxiliar no tratamento junto a pacientes que possuam algum comprometimento significativo em sua vida, que o impeça de realizar tarefas do cotidiano, ou poder se relacionar de maneira saudável com as pessoas a sua volta, sejam elas familiares, amigos e/ou colegas.

“Se encamimha para AT “pacientes com los cuales el dispositivo clássico no es suficiente; o para trabajar em prevension…” (participante 2)

“[…] pacientes que tem limitações significativas de suas vidas, como esquizofrênicos, TAB com sintomatologia mais comprometida, idosos com poucos familiares disponíveis que os acompanhem e lhe deem atenção devida. (participante 3)

“Indico AT naqueles casos em que onde a terapia tradicional de consultório seria limitada, ou então, nos casos em que o cliente não tem habilidades básicas para mudança de repertório e necessita de situações naturais (in loco) para uma melhor aprendizagem, assim como sua independência. Também indico para aqueles casos onde há uma desestruturação da rede de apoio do cliente, em que o AT irá funcionar como mediador da relação cliente – ambiente. Os quadros mais comuns são transtornos psicóticos, transtornos de personalidades graves dependência química, transtornos do desenvolvimento e casos específicos de depressão.” (participante 1)

Ao procurar na literatura as indicações para quais os transtornos o acompanhamento terapêutico pode auxiliar, foi percebido que as indicações para o acompanhante terapêutico se estendem a uma série de sujeitos que possuem dificuldades para estarem vivenciando de forma saudável a convivência em sociedade.

Os transtornos que podem receber indicações para essa modalidade de tratamento podem ser tanto psicóticos, quanto dependentes químicos, pacientes com retardo mental, pacientes borderline, ou qualquer outra psicopatologia grave. (Londero e Pacheco, 2006; Pitiá e Santos, 2005; Rebello, L. 2006; Rossi, 2005; Silva, A. 2005)

Categoria 5: Função do AT, contendo duas subcategorias: individualidade e subjetividade através de uma relação mais próxima com paciente.

Nesta categoria foram incluídas falas que retratam sobre a função do AT durante um tratamento. As subcategorias que se formaram estão relacionadas a funções do AT em um tratamento.

Quando o AT é inserido em algum tratamento, se espera que ele realize funções de contenção, utilizar sua proximidade com o paciente para poder realizar um cuidado mais próximo com o mesmo, poder auxiliar a família no manejo e cuidado com o paciente, controlar a medição, poder ajudá-lo a resgatar seus laços sociais, evitar internações, além de poder usar sua proximidade para trabalhar a individualidade e a subjetividade do acompanhado.

“[…] colabora em la integración social, la no exclusion, previene recaídas, disminuye las reinternaciones. Ayuda a sostener la continuidad del tratamiento, brinda informacion del entorno y de la situacion del paciente; controla la toma de la medicacion.” (participante 2)

“[…] auxiliar/apoio para o andamento mais adequado do restante dos tratamentos, pois pode servir de elo entre pacientes mais comprometidos com os profissionais e familiares. Também atua como ressocializador destes indivíduos.” (participante 3)

Mauer e Resnizky (1987) em Londero e Pacheco citam as principais funções do AT como sendo as seguintes: 1) conter o paciente; 2) oferecer-se como modelo de identificação; 3) trabalhar em nível dramático vivencial e não interpretativo; 4) emprestar o “ego”; 5) perceber, reforçar e desenvolver a capacidade criativa do paciente; 6) informar sobre o mundo objetivo do paciente; 7) representar o terapeuta; 8) atuar como agente ressocializador; e 9) servir como catalisador das relações familiares. Essas funções definidas pelas autoras nos sugere que o AT é uma prática que necessita de objetivos claros para realizar o trabalho junto ao paciente.

Na subcategoria individualidade, a inserção do AT possibilita, através da sua proximidade com o sujeito e fazendo uso de um vínculo, que este possa realizar um tratamento direcionado à individualidade do paciente, se inserindo e conhecendo o paciente e seu jeito para então, poder adaptar e se adaptar ao tratamento com o intuito de ajudá-lo a da melhor maneira possível, a se reinserir na sociedade e adquirir mais autonomia, permitindo que ele possa fazer parte desta sem perder a sua individualidade, adaptando-a para poder viver com uma melhor qualidade de vida no ambiente que o cerca. “[…] a disposição do AT em apreender novas formas de lidar com o cliente, assim como, ter atitudes práticas para a melhora da qualidade de vida do cliente. O AT é a possibilidade de atuar terapeuticamente no ambiente natural do cliente, vivenciando junto com ele as variáveis que o ambiente apresenta.” (participante 1)

A subcategoria subjetividade através de uma relação mais próxima com o paciente está relacionada à proximidade que o acompanhante terapêutico propicia ao iniciar um tratamento. Através da relação que se forma entre acompanhante e acompanhado, existe a possibilidade de se realizar um tratamento direcionado à singularidade do paciente, se inserindo e conhecendo o “mundo” do paciente para então, poder ajudá-lo a se reinserir na sociedade, permitindo que ele possa fazer parte do ambiente a sua volta de uma maneira mais adaptada à mesma.

“El AT es un dispositivo que permite diseñar uma estratégia adecuada a la singularidade de cada paciente, dependiendo de la situación que el sujeto esté atravessando. Para ello el acompañante terapéutico  (a.t.) se insertará em la vida cotidiana del paciente, donde este se encuentre compartiendo com él “su mundo”, su cotidianeidad. Trabaja siempre inserto en un equipo terapéutico colaborando, seguiendo y expandiendo la estrategia del terapeuta.” (participante 2)

Mauer e Resnizky, (1987) em Londero, e Pacheco (2006), falam que as funções do acompanhante terapêutico estão relacionadas desde servir como ego auxiliar do paciente, como ser um representante do terapeuta, prevenir internações, realizar contenção (tanto física quanto emocional), ajudar no cuidado com a tomada de medicações, trabalhar a subjetividade do paciente e auxiliar a família no manejo com o paciente estão entre as funções mais referidas na prática deste dispositivo de tratamento.

Categoria 6: Papel do AT na equipe interdisciplinar

Esta categoria se refere ao papel do acompanhante terapêutico em uma equipe interdisciplinar durante um tratamento. Foi observado que a inserção do AT numa equipe pode beneficiar a todos que compõem a mesma, uma vez que o AT, estando mais próximo do cotidiano do paciente, pode colaborar levando informações sobre o paciente e sua família, assim como sendo em elo entre paciente e equipe.

“[…] quando indico o AT é para ser um tratamento combinado e em equipe, pois geralmente o cliente é atendido por vários profissionais ao mesmo tempo. O AT funciona muitas vezes como um “gerente” do caso, independente de sua formação ou grau de instrução, pois é ele quem está mais próximo do cotidiano do cliente. Necessariamente ele não dá a diretriz de como os outros profissionais devem agir, mas ele abastece a todos com informações relevantes que muitas vezes passam despercebidos ou não são trabalhados na clínica comum de consultório.” (participante 1)

“[…] pode se realizar trocas interdisciplinares sobre o mesmo paciente e sua família.” (participante 3)

A participação do Acompanhamento Terapêutico em equipes interdisciplinares mostra o quanto os participantes consideram importante a inclusão do acompanhante numa equipe, já que assim, tanto a equipe quanto o próprio profissional que trabalha como AT se beneficiariam através da troca de informações sobre o paciente e sua família.

Yagiu (2006) defende a participação do AT nas equipes para um tratamento em conjunto mostrando o quanto pode ser vantajosa a participação do AT para a realização de um planejamento o tratamento feito por todos os profissionais envolvidos no caso, e também aponta para a rede de saberes que se forma numa equipe interdisciplinar, onde cada profissional pode contribuir com seus saberes, seja para criarem possíveis intervenções e manejos para o paciente, seja para desenvolverem estratégias para enfrentarem dificuldades que podem surgir no decorrer do tratamento.

Categoria 7: Inserção do AT na família do paciente.

Nesta última categoria é descrita como a entrada do AT pode, ou não, trazer benefícios para a família e o paciente. Foi visto através dos relatos que, quando a entrada do acompanhante terapêutico é realizada de maneira apressada, ou com urgência, corre-se o risco de que o tratamento possa fracassar, devido ao pouco preparo para a entrada do AT, ou também, o tratamento com o AT pode fracassar quando essa entrada gera na família sentimentos de angústia, fazendo com que haja um boicote da família para com o tratamento.

“Depende do caso, como o AT entra no cerne do meio familiar e percebe e acompanha as demandas e limitações dessa estrutura, pode ser muito benéfico, mas também pode gerar angústia e sensações de intrusão dos familiares, podendo comprometer o tratamento com boicotes, que muitas vezes são inconscientes.” (participante 3)

“[…] muchas veces depende de como se haya trabajado la inserción del acompañante. Es fundamental primero analizar la demanda, si es um at lo que hace falta ali, luego trabajarlo com el paciente y com su família. Cuando se hacen las cosas apuradas por algun tipo de urgencia, puede frazar.” (participante 2)

Essa categoria aponta para a importância de se esclarecer para a família como funciona o trabalho do acompanhante terapêutico e qual serão as suas funções com o paciente, uma vez que, como apontam Alves e Brum, 2006, existe pouco esclarecimento sobre como funciona a prática do AT.

Ocorre também de haver uma distorção no que se refere à percepção do trabalho do acompanhamento terapêutico vindo das famílias que podem perceber o trabalho do AT como somente uma atividade de lazer, não percebendo o caráter terapêutico desta modalidade de tratamento.

Considerações Finais

Encerrando a apresentação deste trabalho, pode-se concluir que o AT é uma prática que está sendo mais valorizada pelos profissionais da Argentina, uma vez que no país já foi criado um código de ética com a intenção de melhorar o uso deste dispositivo, diferente do Brasil onde não existe nenhum código de ética ou documento para tentar legalizar a prática do AT. Através deste código de ética se pode perceber também a intenção da Argentina em valorizar mais essa modalidade de tratamento no âmbito da saúde mental.

Pode-se perceber no decorrer da pesquisa que, a prática do AT ainda não está clara para os participantes, já que ainda existe uma crença de que os casos indicados para esse tratamento estão mais voltados para psicóticos e dependentes químicos.

Hoje em dia o AT contempla uma ampla variedade de psicopatologias, desde transtornos psiquiátricos até transtornos de aprendizagem. No que se refere às funções do AT foi percebido que os profissionais acreditam que o AT realiza um trabalho voltado para o desenvolvimento de habilidades subjetivas com os pacientes e cuidados para com o mesmo, tais como trabalhar autoestima, treinamento de habilidades sociais, prevenção de recaídas, por exemplo.

Talvez o fato dos profissionais não terem experiência em tratamento junto ao AT propicie a falta de conhecimento sobre essa modalidade de tratamento. Portanto, se houvesse mais trabalhos junto a esses profissionais o trabalho do AT seria mais conhecido.

Outro dado importante é sobre a questão da importância da formação profissional para exercer o trabalho de AT, que, como foi discutido anteriormente, é de grande importância para quem possui interesse em trabalhar na nesta área da saúde, assim como a eficácia da inserção do AT em tratamentos combinados.

Seria de grande importância estudos futuros sobre essas questões, pois contribuiriam para melhor compreensão do que é Acompanhamento Terapêutico e de como se dá prática.

No curso desta pesquisa foi percebida a dificuldade em se encontrar material bibliográfico sobre alguns temas importantes como legislação do AT, benefícios do AT no trabalho junto a equipes interdisciplinares e formação para exercer o AT. Seria interessante que houvesse mais estudos voltados para esses aspectos sobre o Acompanhamento Terapêutico, pois ajudaria na divulgação da importância deste trabalho e também para que haja um conhecimento correto sobre esse dispositivo de tratamento.

Referências Bibliográficas

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Nota:

1 – Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Psicologia da Ulbra Gravataí.

Autora

Bruna Rafaela Rodrigues Martins – Psicóloga e Acompanhante Terapêutica (CRP 07/20486). Psicóloga nas Casas de Acolhimento ABEFI (Novo Hamburgo/RS). Fones: (51) 91340513 e 82364224. E-mail: [email protected]

Orientadora: Cláudia Galvão Mazoni – psicóloga, mestre em Psicologia, Orientadora de TCC da Ulbra/Gravataí.

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